Tarrafal:
memórias do Campo da Morte Lenta, de Diana Andringa
A propósito do 41.º aniversário do 25 de Abril
26 de Abril | 15h
Cine Clube do Barreiro
Conversa a seguir à exibição
Tarrafal:
memórias do Campo da Morte Lenta
De: Diana Andringa
Género: Documentário
Classificação: M/6
Portugal, 2010, cor, 88
min.
Sinopse
Chamavam-lhe
«o Campo da Morte Lenta». Os críticos, naturalmente. Que as autoridades, essas,
chamaram-lhe primeiro, entre 1936 e 1954, quando os presos eram portugueses,
«Colónia Penal de Cabo Verde» e, depois, quando reabriu em 1961 para nele serem
internados os militantes anticolonialistas de Angola, Cabo Verde e Guiné,
«Campo de Trabalho de Chão Bom».
Trinta
e dois portugueses, dois angolanos, dois guineenses perderam ali a vida. Outros
morreram já depois de libertados, mas ainda em consequência do que ali tinham
passado. Famílias houve que, sem nada saberem do destino dos presos, os deram
como mortos e chegaram a celebrar cerimónias fúnebres.
«Ali
é só deixar de pensar. Porque, se não, morre aqui de pensamentos. É só deixar,
pronto. Os que têm vida ficam com vida. Nós aqui estamos já quase mortos.» A
frase é do angolano Joel Pessoa, preso em 1969 e libertado, com todos os outros
presos do campo, em 1 de Maio de 1974.
No 35.º
aniversário desse dia, a convite do presidente da República de Cabo Verde,
Pedro Verona Pires, os sobreviventes reencontraram-se para um Simpósio
Internacional sobre o Campo de Concentração do Tarrafal.
‘Tarrafal: memórias do Campo da Morte
Lenta’ resultou
desse reencontro. Durante os dias em que os antigos presos voltaram ao
Tarrafal, gravámos entrevista após entrevista, registando as suas recordações.
Trinta
e dois presos, desde o português Edmundo Pedro, um dos que o estreou, em 1936,
aos angolanos e cabo-verdianos que foram os últimos a deixá-lo, no 1.º de Maio
de 1974, passando pelos guineenses que, ali chegados em Setembro de 1962,
saíram em 1964 uns, em 1969 os restantes. Um guarda, Joaquim Lopes, cabo-verdiano
e convertido ao PAIGC. Uma das raras pessoas que testemunhou a vida no Tarrafal
desde a sua abertura ao seu encerramento, Eulália Fernandes de Andrade, mais
conhecida por D. Beba.
O
documentário faz-se das memórias dos antigos presos, filmados nesse espaço
confinado em que viveram durante anos, «fechados como se fôssemos cabras, com
um fosso à volta, arame farpado e um muro, com os nossos irmãos, armados, a
guardar-nos» (Evaristo Miúdo).
Ouvimo-los
sentados, quase todos, ao lado da «holandinha» – uma cela de castigo, pouco
mais alta que um homem em pé, pouco mais comprida que um homem deitado, pouco
mais larga que um homem sentado, com uma pequena janela gradeada.
Ali
nos falaram das torturas quando da prisão, das ameaças de morte, dos que não
resistiram às condições do campo.
Próxima,
atenta, solidária, a objectiva de João Ribeiro dá-nos toda a força destes
testemunhos, as caras expressivas contra fundo de cela, as mãos e o corpo que
mimam uma cena de tortura, as calças rasgadas pelo chicote e puídas pelo chão
prisional, a bengala que resulta de um longo período pendurado por uma corda
atando os pulsos elevados acima da cabeça, a planta do campo desenhada num osso
de vaca cuidadosamente preservado. A emoção com que homenagearam, no cemitério,
os companheiros que ali ficaram. A alegria de se verem lembrados em duas
exposições nas celas que tinham ocupado.
A
alegria: palavra estranha num filme sobre o Tarrafal. Mas essa é a grande lição
destes homens: porque, como diz um deles, o cabo-verdiano Jaime Scofield, «o
mais importante não é que eles nos tenham querido matar lentamente. O mais importante
é que nós resistimos».
Diana
Andringa
Diana Andringa (Chitato, 21 de Agosto de 1947) é uma jornalista
portuguesa. Estreia-se nos boletins universitários em 1965 e, em 1967, está no ‘Diário
Popular’. Em 1968 é redactora da revista ‘Vida Mundial’, de onde sai
no âmbito de uma demissão colectiva. Até ser presa pela PIDE, por actividades
subversivas, trabalha como ‘copywriter’
de publicidade. Volta ao jornalismo na redacção do ‘Diário de Lisboa’
(1971-1972), acabando por se demitir. Entre 1972 e 1973 vai para França, onde
chega a frequentar o curso de Sociologia na Universidade de Paris 8, em
Vincennes. Regressa em 1974.
Antes de iniciar carreira na RTP passa,
novamente, pela ‘Vida Mundial’ (1976-1977), fixando-se definitivamente
no jornalismo televisivo em 1978. Durante cerca de dez anos foi jornalista do ‘Telejornal’,
e de programas diversos, como ‘Zoom’ (actualidade internacional), ‘Triangular’
(reportagem nacional), ‘Informação 2 – Internacional’, ‘Grande
Reportagem’, ‘Projectos Especiais, Documentais e Eruditos’ ou ‘Departamento
de Artes e Documentários’. Entrevistou escritores como Jorge Luís Borges e
Marguerite Yourcenar ou políticos como Kurt Waldheim, Delfim Neto, Enrico
Berlinguer, Georges Marchais, entre outros. Também na RTP assinou a realização
de vários documentários, entre eles, ‘José Rodrigues Miguéis’ (1998), ‘Jorge
de Sena – uma fiel dedicação à honra de estar vivo’ (1997), ‘António
Ramos Rosa – estou vivo e escrevo sol’ (1997), ‘Rómulo de Carvalho e o
Seu Amigo António Gedeão’ (1996), ‘Vergílio Ferreira: retrato à minuta’
(1996), ‘Corte de Cabelo: história de amor, Lisboa, anos 90’ (1996), ‘Fonseca
e Costa: A descoberta da vida, da luz e da liberdade’ (1996), ‘Humberto
Delgado: obviamente, assassinaram-no’ (1995), ‘O Caso Big Dan's’
(1994), ‘Iraque, o país dos dois rios’ (1985), ‘Aristides de Sousa
Mendes, o cônsul injustiçado’ (1983), ‘Goa, 20 anos depois’ (1981).
Entre
Janeiro e Julho de 2001 foi responsável pelo programa ‘Artigo 37’, na RTP2. Em Julho de 2001 abandonou a RTP,
continuando a ser documentarista independente: ‘Timor-Leste: O sonho do Crocodilo’ (2002), ‘Engenho e Obra: Cem anos de Engenharia em
Portugal’, ‘Guiné-Bissau: As
duas faces da guerra’ (co-realização com Flora Gomes), ‘Dundo, Memória colonial’ (2009) ou ‘Tarrafal: memórias do Campo da Morte Lenta’ (2010).
Exerceu os cargos de subdirectora do ‘Diário
de Lisboa’ (1989-1990), subdirectora de actualidades na RTP1 (1998-2001) e
subdirectora da RTP2 (2000-2001). Integrou a Comissão de Trabalhadores da RTP
(1993-1998) e foi presidente da Direcção (1996-1998) e da Assembleia-Geral
(1998-2001) do Sindicato dos Jornalistas.
Leccionou na Escola Superior de Educação do
Instituto Politécnico de Setúbal (1998-1999) e na Escola Superior de
Comunicação Social do Instituto Politécnico de Lisboa (1998-2001).
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