quarta-feira, 11 de novembro de 2009

Histórias da Caçadeira - Jeff Nichols (12 Novembro, 21h30m, AMAC)



INTENÇÕES DO REALIZADOR

Não existe vitória na vingança.


Esta é a ideia que escolhi explorar com Shotgun Stories (…). Tantas vezes na literatura, nos filmes, na política e na sociedade, a vingança, e, principalmente, a execução da vingança, é considerada um sucesso. Quer seja no preenchimento do seu voto em arruinar Danglar por parte de Edmund Dantes em O Conto de Monte Cristo ou na queda para a morte de Hans Gruhber em Die Hard, a euforia que sentimos enquanto espectadores a assistir ao vilão receber a sua destinada é inegável. Com Shotgun Stories eu queria trabalhar contra esta noção. Eu queria que a vingança fosse uma coisa estranha de precisar e uma causa não necessariamente defendida pelo espectador. A violência é uma tarefa pouco habitual para estas personagens, assim como o é para a maior parte das pessoas. A sua raiva e emoções são válidas, mas as suas reacções a essas emoções não são precisas. A minha esperança é que Shotgun Stories dê um retrato honesto de pessoas normais e trabalhadoras a responderem à dor e ao desgosto de coração que encontram, e que por vezes criam, nas suas próprias vidas.


Na minha opinião, as histórias deveriam ser originárias de um sítio específico. Penso que a história regional força o processo criativo para uma direcção muito honesta. Enquanto realizador gosto da noção de ser reconhecido pela representação correcta do dialecto, do guarda-roupa e em última instância, do sentido do lugar. Afecta a maneira como escrevo, como falo do material com os actores, como a direcção artística se monta e especialmente como filmamos.


Eu cresci no Arkansas numa família com dois irmãos mais velhos e passei uma quantidade de tempo apreciável à volta de sítios e de pessoas que Shotgun Stories tenta retratar. A partir dessas experiências eu sabia que havia certas coisas que queria incluir no meu primeiro filme: uma paisagem de campo aberto filmado com um formato anamórfico, personagens que mantivessem as frases curtas e as emoções resguardadas, uma história sobre as singulares relações entre irmãos, e uma cultura de peixes. Tudo isto eram coisas muito específicas que eu observava enquanto crescia, e era importante que estivessem representadas de forma correcta no filme.


Antes da produção eu tinha um argumento que achava bastante honesto.
O truque era fazer com que o filme também se parecesse com o argumento. Gary Hawkins, um professor que tive e amigo que me ajudou em Shotgun Stories, disse que o trabalho dos realizadores de documentários era estruturar os seus filmes o mais aproximadamente dos filmes narrativos possível, mas que era o trabalho dos realizadores narrativos aportarem tanta realidade para os seus filmes como a encontrada nos documentários. Parece simples, mas a produção de filme narrativo não é particularmente dada ao realismo (especialmente quando feita em película).
Quando estávamos a filmar Shotgun Stories na pequena cidade de England, Arkansas, as pessoas, apesar de imensamente colaborantes, na verdade não gastaram muita energia connosco. Filmámos num stand de hambúrgueres que nunca fechou o negócio. Filmámos também numa lavagem de carros no centro da cidade que ficou aberto durante todo o tempo em que filmámos. Camiões e carros encostavam continuamente para lavar a lama dos pneus. As pessoas não passavam muito tempo a olhar para a câmara porque tinham moedas nos jactos que precisavam de gastar. Não há dúvida de que esta actividade acrescenta tanta energia como valor de produção a estas cenas. Sentes que as circunstâncias com que as personagens do ecrã lidam estão a acontecer e no meio de um sítio muito real. Para as grandes produções este anonimato deve ser difícil de conseguir.


Na história, a coisa mais interessante para mim é que pode passar-se em qualquer lugar. São filmes que não se aproveitam dos detalhes do redor e que têm tendência a aborrecer-me. Os pontos da trama de Shotgun Stories poderiam acontecer em qualquer lado, mas se fosse feito noutro sítio resultaria daí um filme completamente diferente.
O Sudeste do Arkansas é um lugar de combustão lenta. As pessoas deslocam-se em passos seguros num fundo de quintas vastas. Isto para mim significava um formato de 2:35. Significava filmar em quadro em vez de usar imensa câmara à mão. Significa pausas grávidas nos diálogos e não deixar pôr muita maquilhagem nas minhas actrizes.
Significava que a câmara não se mexia, a não ser que fosse absolutamente necessário.


Isto não é um filme que pudesse ser feito noutro sítio qualquer (…). O Arkansas é o filme.

Jeff Nichols

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