segunda-feira, 1 de setembro de 2008

Corações - Alain Resnais (11 Setembro, 21h30m, AMAC)



Thierry, um agente imobiliário, esforça-se muito para encontrar um apartamento para Nicole e Dan, um casal de clientes difíceis.
Na agência, Charlotte, a sua colaboradora, empresta-lhe a cassete de uma emissão de tv que ela adora, “Estas canções que mudaram a minha vida”, um programa de variedades religiosas, visão que muito perturbará Thierry. A irmã mais nova de Thierry, Gaelle, procura secretamente o amor, chegando a recorrer a anúncios de jornais. Dan, militar de carreira recentemente expulso do exército, passa os seus dias no bar do novo hotel do 13º bairro onde confia a Lionel, o barman, as suas desventuras profissionais e sentimentais com Nicole.
Para assegurar o seu serviço de noite, Lionel recorre a uma benévola assistente ao domicílio para tratar do seu pai, Artur, um velho homem doente e colérico. É Charlotte que aparece.
Desta forma, o movimento de uma personagem pode fazer pender o destino de outra sem o conhecer ou mesmo encontrar.
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Não é banal, um filme onde a neve não pára de cair, todos os dias e por todo a parte, às vezes até na cozinha de um apartamento parisiense. Esta intempérie está no centro de Coeurs, o novo filme de Alain Resnais. Ao ponto em que podemos dizer que este filme a cores é feito de neve. É bonito ver a neve cair mas está fria quando lhe tocamos e sobretudo ela acaba sempre por desaparecer. Será Coeurs quente ou gelado? É preciso ter impacto para passar todo este tempo (2h05min) a contar uma busca desesperada onde se cruzam personagens fantasmagóricas onde não há uma única alma nem nada mais.
Um filme onde o mais vivo dos protagonistas é um homem invisível, Arthur, um velho colérico e perverso que não vê nada para além dos seus pés, na cama a que está confinado. É preciso ser-se frio, é preciso ter o cabelo branco como a neve, é preciso ser-se Alain Resnais. A abertura ao sentido sinfónico é a de um grande mestre. A câmara é um pássaro nocturno que pinta o céu, plana entre as torres da biblioteca nacional de França e bate contra as janelas de um apartamento do XII arrondissement de Paris onde a arquitectura de vidro e metal dá a ilusão de transparência. Mas quem está a comandar tal voo? Um Nosferatu? Um kamikaze ? Mais por cobardia do que por maldade, é o míssil do cinema que atenta contra o alvo, um míssil ficcional que rebenta no ecrã. Não causa uma explosão ou carnificina, nem um barulho, nem um grito. O fogo é todo de artifício neste silencioso Coeurs. O que há dentro do filme? Três mulheres e três homens. Cada homem procura a sua mulher (…)
A verdade que transparece em Coeurs é a de que Resnais ama as suas personagens, bizarras mas jamais grotescas, comoventes mas nunca embaraçosas. Ele ama-as como um cineasta, muito afeiçoado aos seus actores.

Gérard LEFORT, Liberation

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